O que vinho, queijo, pão, café e chocolate têm em comum? Além de serem deliciosos, todos eles, em alguma etapa de seu processamento, foram fermentados. Por definição, fermentação é o mecanismo anaeróbico, ou seja, sem a utilização de oxigênio, para obtenção de energia por microrganismos unicelulares, sejam eles bactérias ou leveduras. De forma simplificada, esses microrganismos quebram moléculas de açúcares em outras moléculas menores, como ácidos, no caso dos vinagres; álcool, no caso da cerveja; e lática, no caso dos iogurtes.

Os primeiros registros de que se tem conhecimento a respeito do consumo de alimentos fermentados datam de 6.000 a.C. na Mesopotâmia, onde um líquido, provavelmente o antepassado da cerveja, já era consumido. Datam da mesma época também os primeiros registros de fabricação dos primeiros pães fermentados na mesma região, de vinho na região em que hoje é a Georgia, de bebidas alcoólicas à base de frutas, mel e arroz no que hoje é a China, dentre muitos outros.

Muito provavelmente, a fermentação foi descoberta ao acaso após um alimento ter sido deixado no ambiente e ter sofrido a ação de microrganismos, tendo resultado em um novo produto com sabor e aroma agradáveis, mais duráveis do que a matéria prima que o originou. Isso significa que a fermentação possibilitou que o ser humano pudesse armazenar alimentos que antes eram altamente perecíveis.

Todo o desenvolvimento de alimentos fermentados durante a história da humanidade foi feito de forma empírica. Foi apenas em meados do século 19 que o mecanismo começou a ser compreendido a partir do trabalho do químico Louis Pasteur. Em seu trabalho, ele pode compreender que o processo, inicialmente chamado de “respiração sem ar”, ocorria simultaneamente com o crescimento celular. Essa descoberta colocou um ponto final à era da crença em geração espontânea.

Devido à complexidade dos processos de fermentação, diversos compostos são formados. A combinação destes, a depender do substrato, é fundamental para a formação de sabores e aromas específicos, além de influenciar substancialmente a textura dos alimentos.

Os tipos mais conhecidos de fermentação são aplicados na fabricação dos mais diversos alimentos até hoje. Na fermentação alcoólica da cerveja, Saccharomyces cerevisiae usa os carboidratos da cevada como alimento e, como subprodutos, excreta álcool, gás carbônico e água. Esse mesmo fungo é usado como fermento de pães, onde o gás carbônico fica aprisionado na rede de glúten, resultando em uma massa aerada. Na produção de vinho, esse também é o principal microrganismo envolvido.

O ácido acético é produzido na fermentação acética de diversos vegetais, incluindo uvas, maçãs e arroz, dentre outros. O produto mais conhecido resultante deste tipo de fermentação é o vinagre. Ao contrário da fermentação alcoólica, os microrganismos envolvidos são algumas espécies de bactérias que usam o álcool como substrato para produzir ácido acético e água.

Outro tipo de fermentação bastante popular é a fermentação lática, que é realizada exclusivamente por Lactobacillus. Moléculas de glicose são transformadas em ácido lático, liberando energia. Iogurtes e queijos são alguns dos alimentos produzidos por esse processo.

Contudo, alimentos como salames e outras carnes curadas, café, chocolate, kimchi, molhos a base de cereais, como o shoyu, a base de peixes, tempeh, miso, kombucha e mais um incontável número de outros produtos são fabricados ou utilizam a fermentação em pelo menos uma etapa de sua produção.

A fermentação usada na produção de alimentos é um dos exemplos clássicos de como microrganismos podem ser e são nossos aliados. Além de possibilitarem o armazenamento de alimentos por longos períodos em épocas em que ainda não havia como conservar alimentos por refrigeração, eles nos apresentaram uma enorme variedade de aromas e sabores que são altamente apreciados até hoje.