Em texto anterior, falei da representação do espaço, dos mapas e da sua diversidade. Belos, estranhos, sedutores, fabulosos… depois, progressivamente rigorosos, baseados em conhecimento de experiência feito… até que a microbiologia revele sincronicidades entre o que está em cima e o que está em baixo (Hermes Trimesgisto).

Se a relação entre Terra, Sol e Lua revela unidades de tempo por distinta disposição da tríade e a sua periodicidade (dia/noite, mês, estações, ano), a necessidade de ‘mapear’ o tempo na linearidade passado-presente-futuro conduz aos calendários, diversos, metamórficos, cuja tipologia é variada. Em função do factor dominante, o calendário será, respectivamente, sideral, solar, lunar ou lunissolar.

E pluribus unum?

Só a unidade ‘ano’ já apresenta variação inesperada. Em astronomia, cada um tem a sua duração:

• o ano trópico, também chamado de ano solar ou ano das estações, tem 365 dias, cinco horas, 48 minutos e 46 segundos (entre duas ocorrências sucessivas do equinócio vernal, do momento em que o Sol aparentemente cruza o equador celeste na direção norte);

• o ano sideral, que tem 365 dias, seis horas, nove minutos e dez segundos (tempo da trajectória completa do Sol);

• o ano anomalístico compreende o período de 365 dias, seis horas, 13 minutos e 53 segundos, entre duas passagens da Terra pelo periélio, ponto de sua órbita em que está mais próxima do Sol;

• o ano gregoriano , usado na maior parte do mundo, um ano comum compreende 365 dias, mas a cada quatro anos há um ano de 366 dias – o chamado ano bissexto, em que o mês de fevereiro passa a ter 29 dias;

• o ano lunar, de 12 meses sinódicos, correspondentes aos 12 ciclos da fase lunar, tem cerca de 364 dias, com meses alternados de 29 e 30 dias e o mês lunar médio de 29 dias e 12 horas.

Poderíamos, ainda, mencionar a grande angular das precessões: ciclos de 26.000 anos contemplando 1.300 ciclos Nutacionais. E o ‘grande ano’, período cíclico-cósmico dos caldeus, persas pré-islâmicos, gregos e outros, de cerca 13.000 anos .

Dependendo da sua cosmovivência/cosmovidência, assim era o calendário. Desde os egípcios e os babilónios, foi sendo transformado (por Copérnico e Ptolomeu, no tempo de Augusto (Alexandrino), ainda usado, etc.). Judaico , hindu , asteca , maia , indonésio …

Também os nomes dos meses homenageiam quem hoje esquecemos: Janeiro (Janus), Março (Marte, deus da guerra), Abril (do herói Aper/Aprus ou corruptela de Afrodite, aphrilis?), Maio (Maia, filha de Atlas), Junho (Juno), Julho (Júlio César), Agosto (Augustus), etc..

Breve história (das modificações do) calendário romano

A título de curiosidade, reproduzo um dos muitos descritivos da história das modificações do calendário romano (apenas dele) para que se constate de que modo os progressos de conhecimento promoveram a sua alteração:

«O primeiro calendário romano foi criado por Rômulo em 753 a.C., ano de fundação de Roma, baseado no calendário egípcio. Era um calendário lunar, e tinha 304 dias, divididos em dez meses, dez meses lunares, seis de 30 dias e quatro de 31, desde Março a Dezembro. O primeiro mês é o Martius (Março) e adota a meia-noite para início do dia.

»É atribuído a Rômulo. Numa Pompilius,discípulo de Pitágoras, que por tradição foi o segundo rei de Roma (715-673 a.C.?), acrescentou-lhe mais dois meses, Janeiro e Fevereiro, para um ano de 354 dias.

»Em (616-579 a.C.) o etrusco Tarquinius Priscus, por receio supersticioso dos meses com números pares, deu um dia mais a Janeiro, e sistema passou a ser de um ano com doze meses e 355 dias. Janeiro tinha 29 dias, Fevereiro tinha 28 dias, Maio, Julho e Outubro 31 dias, Janeiro, Abril, Junho , Agosto , Setembro, Novembro e Dezembro 29 dias.

»Estes anos de 366 dias, chamam-se bissextos, porque os latinos chamavam ao dia 25 de Fevereiro “bi-sextus kalendas Martii” quando este tinha 29 dias. Mudou-se também o nome do quinto mês do ano “quintilius” para Julho (Julius) em homenagem a Júlio César, e mais tarde o sexto mês “sextilius” passa para o que hoje é Agosto (Augustus) em homenagem a Octávio César Augusto.

/…/

»Assim, o ano fica com 355 em vez de 354, que era o valor do ano lunar, para evitar o suposto azar de um número par. A cada dois anos, há um 13º mês, Mercedonius, com 22 ou 23 dias.

»Os anos no calendário romano eram chamados de a.u.c. (ab urbe condita), a partir da fundação da cidade de Roma. Neste sistema, o dia 11 de Janeiro de 2000 marcou o ano novo do 2753 a.u.c.

»Mais tarde Júlio César criou o calendário juliano, numa reforma aconselhada pelo astrônomo alexandrino Sosígenes, adotando um calendário com 365,25 dias no ano trópico, que mesmo assim era maior que o ano solar em 11m e 14seg. Isto dava um erro de 3 dias em cada 400 anos.

»Desta forma, atribuiu 445 dias ao ano de 46 a.C., para reajustar o ano civil ao solar. Este ano é chamado de Ano da Confusão. A diferença de 6 horas entre o ano solar e o ano civil era ajustado de 4 em 4 anos, no mês de Fevereiro, dia 24, repetindo esse dia».

Enfim, comparando-os, vemos (dis)semelhanças nas durações, no ciclo e nas designações, cristalizando tópicas de diferentes culturas: Figura 1

Há casos singulares, como o da Revolução Francesa, usado só 14 anos .

Dada a complexidade, há Conversores de Datas: Gregoriano-Islâmico/Árabe , Gregoriano- Hebreu , Gregoriano-Persa , às vezes, juntando-os, como o faz o conversor Fourmilab (gregoriano, juliano, hebreu, islâmico, persa, maia, indiano, da revolução francesa, da International Standards Organisation (ISO), Unix, Excel, Machintosch).

As semanas, apesar de unidade de tempo mais reduzida e, portanto, mais consensual, evocam divindades diferentes dos diversos panteões: Figura 2

Dos relógios de sol ao Tempo Universal Coordenado

À medida que avançamos para os medidores de períodos de tempo mais reduzidos, eis-nos na dimensão do dia e das suas subdivisões.

Figura 3

Os relógios. Os de Sol. Os de água (clepsidras) ou de areia (ampulhetas), na Babilónia e no Egipto (c. séc. XVI a. C.). Os relógios de xadrez, atómico, de azeite, floral, de pêndulo, de quartzo ou digital. Os mecânicos, como o de Yi Xing (725) ou o oferecido a Carlos Magno pelo califa de Bagdad Harun al-Rashid (c. 797-801), até ao de bolso de Peter Henlein (Nuremberg, c. 1500) ou ao “do Longo Agora” (Relógio dos 10.000 Anos), da Fundação Long Now, concebido por Danny Hillis (1989) para funcionar durante 10.000 anos e cujo primeiro protótipo começou a funcionar na passagem do ano de 1999 para o 2000. Os combinados com outros mecanismos (rádio-relógio-despertador-leitor-gravador…), que o 007 e os super-heróis sofisticaram.

A hora. Se a noite domina um dos lados da terra enquanto o outro é iluminado pelo Sol, houve que explicar, com graduação, esta diferença. Os fusos horários dividem a terra em 24 zonas (horas do dia), cada uma delas abrangida pela mesma hora, todos eles definidos relativamente ao Tempo Universal Coordenado (UTC) (medida derivada do Tempo Atómico Internacional (TAI)), fuso horário de Londres (quando não está no horário de verão) onde se localiza o meridiano de Greenwich, referência anterior (Tempo Médio de Greenwich/Greenwich Mean Time, GMT, medida definida pelo sol e pelas estrelas). Daí os novos Relógios Mundiais com Mapas dos Fusos Horários Mundiais , muitas vezes, com a hora local (a do IP do nosso computador) em destaque (caso de Hora do Mundo ), Daí, também, o software de sincronização horária .

O minuto e as suas divisões. Os cronógrafos , sendo os analógicos de uma precisão até centésimos de segundo. Até aos relógios atómicos, sempre em busca da maior precisão...

Figura 4 e Video

Por fim, a necessidade de preencher de humanidade e da sua história essas 24h, eis iniciativas com títulos como Notícias ao Minuto.

E poderíamos referir calendários interactivos, cronologias específicas. Os modelos para construir, como os apresentados pela Educational Technology and Mobile Learning. Ou os já feitos e temáticos, como, por exemplo, a da evolução da web ou os da Time Rime .

Tudo isto acaba por exigir a regulação destes reguladores. A hora legal e a instância que a gere (em Portugal, o Observatório Astronómico de Lisboa - OAL), com informação diversa: como usar os servidores públicos ntp do OAL nos diversos sistemas operativos, legislação sobre a definição da hora legal/oficial e a sua história, Tempo Universal Coordenado, Comissão Permanente da Hora, etc.

Enfim, estamos no domínio das listas que sinalizam a inventividade do Homem, mas também a sua obsessiva busca de domínio das suas circunstâncias, pois contar, como cartografar é, de certo modo, dominar pela representação o que não se domina de facto. Apetece, aliás, dizer, que ele procura também fazer isso dissimulando na objectividade do processo/mecanismo a subjectividade da sua presença e vivência: o relógio e o calendário poderão ser os lugares onde o indivíduo procura projectar-se no universo e na sua história (ou vice-versa), assemelhando-se à ambição simbolizada no homem de Vitrúvio de Leonardo da Vinci (c. 1490), codificador dum ‘Cânone das Proporções’ em função da relação homem/mundo/universo, pois a área do círculo é idêntica à do quadrado e o desenho é um algoritmo para calcular o phi (c. 1,1618), número ou proporção áurea que Fídias usou para conceber… o Parthenon. Eis como os medidores do tempo nos levam aos algoritmos e às Artes, onde todos os saberes se cristalizam e sinalizam…